segunda-feira, 26 de setembro de 2011

Absurdo!!!

Um motorista do Senado ganha mais para dirigir um automóvel do que um oficial da Marinha  para pilotar uma fragata ! http://www.naval.com.br/blog/wp-content/uploads/2009/06/fragata-bosisio-f48.jpg

 Um ascensorista da Câmara Federal ganha mais para servir os elevadores da casa do que um  oficial da Força Aérea que pilota um Mirage. http://www.aereo.jor.br/wp-content/uploads/2009/07/mirage-f-1-ct-foto-armee-de-l-air.jpg

Um diretor que é responsável pela garagem do Senado ganha mais que um oficial-general do Exército que comanda uma Região Militar ou uma grande fração do Exército. 
http://g1.globo.com/Noticias/Politica/foto/0,,14415981-EX,00.jpg

Um diretor sem diretoria do Senado, cujo título é só para justificar o salário, ganha o dobro do que ganha um professor universitário federal concursado, com mestrado, doutorado e prestígio internacional. http://www.teclasap.com.br/blog/wp-content/uploads/2007/12/professor.jpg

Um assessor de 3º nível de um deputado, que também tem esse t ítulo para justificar seus ganhos,  mas que não passa de um "aspone" ou um mero estafeta de correspondências, ganha mais que um cientista-pesquisador da Fundação Instituto Oswaldo Cruz, com muitos anos de formado, que dedica o seu tempo buscando curas e vacinas para salvar vidas. http://www.estadao.com.br/fotos/GermanBuitron_UnamDiv288.jpg

O SUS paga a um médico, por uma cirurgia cardíaca com abertura de peito, a importância de R$ 70,00, equivalente ao que uma diarista cobra para fazer a faxina num apartamento de dois quartos. http://t1.gstatic.com/images?q=tbn:ANd9GcTDjcRERR8U8-ooBcBYpygXDUC5alubm2eaVgtuQNE1NPnvHu4q&t=1

PRECISAMOS URGENTEMENTE DE UM CHOQUE DE MORALIDADE NOS TRÊS PODERES DA UNIÃO,  ESTADOS E MUNICÍPIOS, ACABANDO COM OS OPORTUNISMOS E CABIDES DE EMPREGO. OS RESULTADOS NÃO JUSTIFICAM O ATUAL NÚMERO DE SENADORES, DEPUTADOS FEDERAIS, ESTADUAIS E VEREADORES, TAMPOUCO O DINHEIRO GASTO PARA MANUTENÇÃO DESTE CONGRESSO NACIONAL, QUE É O MAIS CARO DO MUNDO. TEMOS QUE DAR FIM A ESSES "CURRAIS" ELEITORAIS, QUE TRANSFORMARAM O BRASIL NUMA OLIGARQUIA SEM ESCRÚPULOS, ONDE OS NEGÓCIOS PÚBLICOS SÃO GERIDOS PELA “BRASILIENSE COSA NOSTRA”. O PAÍS DO FUTURO JAMAIS CHEGARÁ A ELE, SEM QUE HAJA RESPONSABILIDADE SOCIAL E COM OS  GASTOS PÚBLICOS. JÁ PERDEMOS A CAPACIDADE DE NOS INDIGNAR. PORÉM, O PIOR É ACEITARMOS ESSAS COISAS, COMO SE TIVESSE QUE SER ASSIM MESMO,  OU  NADA PODEMOS FAZER, OU TEM MAIS JEITO. VALE A PENA TENTAR. PARTICIPE DESTE ATO DE REPULSA. 
REPASSE! NÃO SEJA OMISSO. 
VAMOS DAR UM BASTA AO CONGRESSO NACIONAL E SUA QUADRILHA. 

segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Crônica do Paraíso


Escarafunchando seus alfarrábios, Léo Nove deparou com sua primeira Bíblia e, dentro dela, encontrou o último bilhete que lhe enviara Esther – paixão de toda sua juventude –, dizendo-se farta de esperar dele uma iniciativa, qualquer que fosse.
Após amassar o bilhete, escrito em pa­pel de pão, resolveu quedar-se num canto qualquer daquele cafofo e se pôs a ler, nas Sagradas Escrituras, o capítulo 3 de Gêne­sis. Esgotado que andava, logo deixou-se abraçar pelo Morfeu e, como sempre, aca­bou embarcando na sua máquina do tempo e dos sonhos, indo parar lá no Éden. O que se lê adiante, portanto, não é o fiel relato bíblico, pero fruto da tresloucada viagem de Antônio Leonardo Petronov de León, vulgo Léo Nove, ao Paraíso.
Era uma casa muito engraçada, não tinha teto, não tinha ventilador de teto. Não tinha garagem, varanda, quarto, sala, cozinha, banheiro, nada disso. Tubos e conexões Tigre, nem pensar...!
Mas morava ali um casal que vivia fe­liz, apesar de não ter tantas coisas que são hoje imprescindíveis, como aquele celular­zinho minúsculo quase do tamanho de uma pulga atrás da orelha e que insiste em dizer que não é um celular. A comunicação entre eles era ao vivo, em som alto e claro, con­tavam tudo um para o outro tim-tim por tim-tim e, por isso, não precisavam fazer 21 nem trrrrriiiiinta e um... Mas vamos aos fa­tos.
O varão acordou, espreguiçou, fez aquele “uaaaaahhhh!!!”, esfregou os olhos, levantou, mijou, foi até o rio e tchibum! Nadou à vontade, brincou com a água e, só depois disso, resolveu escovar os dentes. Como não usava toalha, deixou a água escorrer pelo corpo até secar e, só então, destinou alguns minutos a observar e admirar o corpaço da varoa, que ainda dormia feito uma pedra. Aproximou-se devagar e despertou-lhe com aquele beijo no cangote, coisa que ela adorava.
- Bom dia, minha flor!
- Pra você também, gato. Fez café?
- Ainda não, coisa linda. Mas faço rapidinho, se você quiser, sei lá...
- Precisa não, amor. Deixa comigo. Me dá só tipo assim um tempinho, tá?
A varoa não espreguiçou, mas fez “huuummm...!”, ajeitou os cabelos, levan­tou-se e também foi até o rio, onde tomou banho, nadou um pouco e aproveitou para fazer xixi. Saindo, fez também a sua higi­ene bucal e preparou o café da manhã.
Depois do “café” (entre aspas, porque café mesmo não tinha; só pêra, uva, maçã, banana, mamão, melão, suco de laranja, essas coisas...), resolveram conversar um pouco e acabaram, como sempre, rolando pela relva. Quando se cansaram da brinca­deira, correram de mãos dadas para debaixo da cachoeira. Após o banho, o varão se des­pediu, dizendo:
- Assume o comando aí, amor, que eu preciso dar uma saidinha...
- Cê vai aonde?
- Vou comprar cigarros, tomar uma cerveja e jogar uma peladinha, sei lá...
Estava brincando, claro. Não fumava, não bebia, nem jogava futebol. Riram.
- Cê não tem jeito mesmo. Hmmm, mas eu te adoro... Hmmm (beijo)...
- Tô indo colher mais maçãs, abacaxi e manga... sei lá... Vou aproveitar pra ver como estão os peixes. Ontem, tinha cada um bitelão assim, ó.
-  Tá bom, vai lá.
Já ia ele saindo, quando ela se lembrou de algo que estava querendo.
- Ah,  traz... tipo assim... alguns oplops também.
- De novo esse papo de oplops... Você quer dizer kiwi...
- Ora, você sabe que eu não acerto fa­lar isso. E não gosto desse nomezinho bobo.
- Tudo bem, tudo bem, mas... peraí! Você nem gosta disso...!
- Poxa, mô... é que eu estou tipo assim com desejo... – Colocou a mão no ventre, alisou e fez aquela carinha de dengo. – Traz, vai...!
Pode deixar, amorzão! Deixa comigo. Fui!
E foi mesmo. Saltitando que nem um ca­brito e cantarolando, feliz da vida por não ter sogra, cunhados, parentes, vizinhos, chefe, horário a cumprir, essas coisas. E a mulher estava grávida.
Aproveitando que a varoa ficou só, a serpente aproveitou pra fazer aquela visitinha surpresa. Enroscou-se num dos galhos da árvore proibida e chamou:
- Pssssit! Varo-a!
- Ah, não! De novo não! Que que você quer desta vez?
- Conversar um pouco, poxa!...
- Tá bom... E sobre o que você quer conversar?
- Sobre a maçã, ora...
- Que que tem a maçã?
- Como, que que tem? Então não é ela o tal fruto proibido?
- Tá doida! Qual foi o jacaré que te falou isso?
Mas um jacaré que andava por ali protestou.
- Peraí, varoa, não fui eu não! – Apontou para o jerico. – Foi ele, ó.
- Ah, logo vi! Só podia ser tipo assim idéia de jerico! – Protestou a varoa.
- Mas veja bem, se não é a maçã, qual que é, então?
- É esse aí, ó. Dessa árvore onde você está.
- Menina! Se você não me fala, eu morria sem saber...!
- Aliás, magrela, é até melhor descer daí. Porque se você derruba um desses frutos, quem vai ter que pagar o pato é a mamãe aqui. Desce logo, anda!
- Tá legal, tá legal! Tô descendo, ó! - Desceu. Só não desistiu de azucrinar – Mas... veja bem,  querida, eu ainda não en­tendi uma coisa: o que é mesmo que acon­tece a você e seu maridão, se comerem isso?
- Acontece isso, ó, tipo assim: gente morre. Aí, Já era...!
- Du-vi-de-ó-dó! Aposto que ele só disse isso pra meter medo em vocês!
- Ah, fala sério!
- Pois veja bem! Ele sabe que, se vocês comerem, vão ficar que nem ele...
- Tipo assim, como?
- Ora... Assim, veja bem, conhecedo­res do bem e do mal...
- Tá brincando!...
- Tô nada! É sério!
Ao contrário do que a cobra esperava, a varoa desceu o morro, chutou o balde, o pau da barraca, soltou todos os cachorros, botou pra quebrar.
- Escute aqui, sabidona! Eu não admito que você venha aqui na minha casa e chame o meeeeu Criador de mentiroso não, tá? Faz favor! Se vai continuar com isso, é melhor vazar, antes que eu perca as estribeiras. Olha que se eu te pegar, não vai sobrar nem um talisquinho assim de você pra contar história. Deu pra entender ou você quer que eu desenhe?
- Entender, eu entendi. Mas, veja bem, acho que você está é exagerando. Ele também é o criador de tudo quanto é bicho que anda solto por aí, e nenhum deles é desse jeito, tiete que nem você...
- Só que tem uma coisa, ô criatura. Comigo é tipo assim beeem diferente!...
- Humpf...! Não sei por quê!
Aí a varoa resolveu zoar a serpente e pegou pesado.
- Então, tá bem, dona Serpentilda, você pediu! Não faz muito tempo, eu era só uma costelinha e me sentia insignificante. Aí, o Criador fez o varão dormir tipo assim que nem uma pedra, me pegou, e... tchan-tchan-tchan-tchan! Olha o que ele fez!
Pára! Congela! Merece uma pausa. A pose que ela fez ao dizer isso foi simples­mente antológica. Coisa de cinema. Num rápido movimento, jogou para trás as lon­gas e lindas madeixas; levantou bem os braços e, tocando de leve com as pontas dos dedos, veio descendo desde o alto da cabeça e percorreu as laterais do rosto, o pescoço, os seios, o tronco, até descansar as mãos sobre os quadris, e para fechar com chave de ouro, deu aquela voltinha, jogou a perna direita para a frente e olhou bem para a mo­créia, de cima, assim, ó, com um olhar bem gelado. Imagine a cena...!
- Aaaaaiii, que nojenta! Como é con­vencida! – disse a criatura, revoltadíssima.
- Sou mesmo, e pronto! E acho bom você não se esquecer disso, tá? – Falou as­sim, porque a cobra já estava mesmo caindo fora, dando uma desculpa muito da esfarra­pada:
- Bem, fofa, o papo tá bom, mas veja bem, eu preciso ver minhas crianças.
A varoa não perdeu tempo:
- Ora, quer saber? Já vai tarde!
O ofídio saiu dali triscando de raiva, reclamando sozinha, falando cobras e la­gartos.
- Essa perua me paga! Ah, se paga...! Isso não vai ficar assim não...
Ora, havia muitos macacos (cada um no seu galho, claro) e outros bichos em volta, assistindo à cena. A macacada, inclu­sive, ria mais do que as hienas. Os papa­gaios é que riram pouco, porque estavam mais interessados em matraquear e comen­tar o fato, maquinando já como iam trans­formar o episódio em mais uma piada.
E pelo menos, temporariamente, a paz voltou a reinar no acampamento...
- Querida, cheguei! – gritou lá da en­trada o varão.
- Oi, amor!... Já estava morrendo de saudades...
Abraçaram-se, beijaram-se, e ele per­guntou:
- Alguma novidade?
- Tem sim. O neném mexeu! Olha, deu cada chute...!
- Pois é bom ir se acostumando, que daqui pra frente vai ser assim mesmo...
- Ah, e tem mais uma. Aquela criatura peçonhenta veio aqui de novo me encher a paciência. Só que, desta vez, eu dei tipo assim um chega-pra-lá nela que você preci­sava ver...! Se ela tivesse pernas, colocava aquele rabo horroroso no meio.
- Incrível, né! Ela não desiste... Sei lá...!
- Ai, amor... Vamos nos mudar logo daqui. Não suporto mais isso.
- Na-na-ni-na-não! Quem vai ter que se mudar é ela! Pode deixar, que hoje mesmo eu vou trocar uma idéia com o Cri­ador.
- Hmmmm... Promete?
- Prometo...! E agora, que tal a gente almoçar? Tô com uma fome de leão...!
- Nada disso, meu porquinho. Primeiro você vai é tomar tipo assim um banho! Eca! Tá fedendo que nem um gambá...!
Foram os dois. E desta vez, teve banho de cachoeira e de rio... Pra relaxar, brinca­ram de jogar água um no outro e, só depois, almoçaram. A sesta durou bem umas duas horas e, a seguir, foram namorar...
Algum tempo depois, estava nova­mente a varoa sozinha cuidando da casa. O varão tinha saído, como sempre, dizendo que ia colher frutas e cuidar do jardim. Nesse dia, porém, demorou-se mais do que de costume, o que acabou complicando as coisas para a varoa. É que a serpente, em nova investida, lançou mão de mais uma de suas artimanhas:
- Veja bem, lindona. Se a ordem de não tocar nesse raio desse fruto foi dada para o varão, então que que você tem a ver com isso?
Por essa ela não esperava! Acabou ce­dendo:
- É... Tem sentido... Acho que não vai fazer mal algum.
Foi aí que ela olhou com mais inte­resse para o fruto da árvore, e cresceu-lhe por dentro um desejo incontrolável de pro­var.
Provou. A princípio, achou que ali mesmo cairia dura, esticaria as canelas, mas nada! Continuou vivinha da silva! Só que, a partir de então, afloraram-se os seus medos, e uma estranha sensação invadiu-lhe o inte­rior, ao mesmo tempo em que sentia-se num mato sem cachorro, com aqueles horríveis calafrios por todo o corpo e uma vergonha horrível de estar completamente nua. Não sabia explicar o que estava acontecendo. Soluçou.
- E agora, quem poderá me defender...?
E como não surgiu do nada o Chapolin Colorado, dizendo “Eu!” – a serpente apro­veitou a deixa.
- Fica fria, varoa. Afinal, veja bem, você não mor-reu, né?!
- Sei lá... Acho que botei tudo a per­der...
É... o caldo estava mesmo derramado. Mas a varoa descobriu que era capaz de dissimular toda a sua insegurança. Isso ficou claro para ela quando o varão chegou...
- Oi, amor, cheguei... – gritou, como sempre, lá da entrada.
Uma gazela que passeava por ali achou melhor alertá-lo:
- É melhor você se preparar, varão. A varoa está uma arara!
- Valeu, gazela. Deixa comigo. – Dirigiu-se à esposa. – O que houve, mulher? Cê tá estranha...! – perguntou, intrigado.
- É só isso que tem pra me dizer, senhor Varão? Isso é hora de chegar em casa? Hein? O que estava fazendo até agora, hein? Procurando Nemo?... Como é, não vai dizer nada não? O gato comeu sua língua?
Só quando ela fez um intervalo naquela verborréia desenfreada, ele falou...
- Calma, filha...! Por que esse nervosismo todo...?
- Calma os cambau! E eu não sou sua filha não, tá? Cê sabe que horas são?
- Sei lá... dez pra daqui a pouco...
- Esse cara é palhaaaaço...! – disse a gazela, rindo.
Só que a varoa não achou um pingo de graça.
- Muito engraçadinho... Está é na hora de a onça beber água, isso sim!... E tá me olhando desse jeito por quê! Por acaso eu estou tipo assim de verde?
- Pior que tá mesmo. Por que não está de topless? Que negócio é esse de cobrir o busto e abaixo da cintura com folhas de figueira? Ficou maluca?
- Fiquei foi farta de andar pelada. Tomei vergonha. Acho, aliás, que você devia fazer o mesmo. – Deu uma voltinha... – O que achou do modelito?
- Ah, sei lá...! Horrível! Prefiro como era antes...
A gazela resolveu comprar o barulho da varoa:
- Liga pra esse despeitado não, lindona. Você está chiquer-rer-rer-rérrima!!!
Sem dar importância à gazela enxerida, o varão retomou a palavra:
- Sabe... Agora que reparei uma coisa... Que é isso que cê tá comendo?
Ela respondeu dando mais uma mordida no tal fruto, e com a boca cheia:
- Icho aqui? Oga, é o tal frutcho proibídio...! Uma delíchia...! Desce redondo e refresca tipo assim até pensamento.
Aí foi que o barraco desabou. A festa ficou do jeito que o diabo gosta, e o varão, doidinho:
- Suspeitei desde o princípio! E quem foi que deu autorização, hein? Hein?
A serpente, até então calada, se meteu na conversa:
- Ora, fica frio, mano véio. Veja bem... Fui eu que dei uma idéia e... – não conseguiu completar.

- Pois agora, sua víbora, você vai ver com quantos paus se faz uma canoa...
O varão só não converteu a criatura em purê de cobra, porque foi seguro por um baita dum gorila muito do feio que trouxe com ele a turma do deixa-disso. E, enquanto o varão se debatia dizendo “Me larga, seu comedor de bananas!” o restante da bicharada encarregava-se de envenenar a fofoca, querendo ver o circo pegar fogo. Alguns estavam até cantando:
- Poeira... Poeira... Poeira... Levantou poeira...
- Que que tá pegando?
- Por que esse furdunço todo?
- Foi a varoa que deu piti...
- Fala sério! Quer dizer que, finalmente, eles quebraram o pau?
- Com certeza! Tá maior barraco!
- Ih! Que mico!
- O varão deu na cara dela...?
- É ruim, hein! Esse mané não faz mal a um mosquito...!
- Quero nem saber. Em briga de marido e mulher ninguém mete a colher...!
- Parece que ele pegou ela com a boca na botija...
-  Ouvi dizer que vão se divorciar...
- CHEEEEEGA! – Gritou a varoa, a fim de pôr ordem no recinto.
E tudo se acalmou, como ela queria.
- Aí, negão, dá pra me soltar? – pediu o varão, mais calmo.
- Tudo bem, eu solto. Mas vou ficar de olho em você. Acho bom não facilitar.
Prometeu se comportar e dirigiu-se à esposa:
- Poxa, amor! Sei lá... Como você faz um negócio desses? Pedi trocentas vezes pra não ficar de trololó com essa minhocona doida nem aceitar idéia dela...
Sem ter como se justificar, a varoa ironizava, cantando:
- Tô nem aí... Tô nem aí...!
- Pronto! Agora, já era mesmo...! – disse o varão.
A serpente, mudando de tática, resolveu atacar de novo:
- Acho que não, chefia. Veja bem: primeiro que, pelo que eu sei, a ordem de não comer do raio do fruto foi dada só pra você...
- É... em parte... Mas... Sei lá... – A serpente o interrompeu:
- Peraí, que eu ainda não acabei. – Fez uma breve pausa e prosseguiu: – Poxa, companheiro, a varoa tá inocente na parada. E, além disso, veja bem, ela não morreu, como o Criador tinha dito...
- Mesmo assim, sei lá, continuo achando errado contrariar uma ordem dele...
- Mas é muito cara de pau! Então você acha certo deixar a patroa sozinha nessa canoa furada? Cadê a tal de solidariedade? Que espécie de marido é você? Ah, já vi tudo! Fica aí dando uma de bom moço, vestido em pele de cordeiro, mas é maior joão-sem-braço, um tremendo amigo da onça...!
- Peraí, também não é assim não... Sei lá! – Disse, meio desconcertado.
- Então, veja bem, o que que tá faltando, então pra você experimentar do fruto? – perguntou a serpente.
- Isso mesmo, bem! – disse a varoa.– Experimenta!
Não faltava mais nada. A um sinal da serpente, toda a bicharada fez um coro:
- EXPERIMEN-TA! EXPERIMEN-TA! EXPERIMEN-TA!...
- Tá bom, tá bom! – disse, interrompendo a galera. – eu experimento.
Pegou da mão da varoa o fruto e “tchack!”, mordeu. Pronto, degringolou geral! Sentiu, pela primeira vez, vergonha de estar peladaço, fez aquela pose de jogador de futebol na barreira, vestiu a tanga de folhas e caiu num pranto desesperado. Só que já não adiantava chorar pelo leite derramado. Em outras palavras, deu zebra.
A bicharada dispersou. A cobra já estava fumando, a onça foi beber água, a vaca foi pro brejo, e o burro, coitado, morreu pensando. O Criador chegou e passou maior descompostura nos três, isto é, no varão, na varoa e na serpente, que foi condenada a comer pó durante todos os dias de sua existência. Quanto ao casal, teve que vazar do Paraíso...

Enquanto houver tempo

Enquanto houver tempo, haverá vida... Vale a pena ouvir a voz do vento sussurrando no pensamento palavras brandas que desviam para longe toda arrogância e batem de frente com toda mágoa e com todo orgulho ferido.
Há tempo, é tempo. Vale a pena dizer “Eu te amo!”, não apenas a quem se quer dizer, mas também a quem precisa ouvir.
Enquanto houver tempo, haverá esperança... Vale a pena calar por um momento e arrancar do pensamento qualquer sentimento deprimente que só deixa, a cada dia, a mente e o corpo mais doentes.
Há tempo, há vida. Vale a pena crer no verdadeiro amor, que tudo vence, tudo supera, tudo suporta, seja injúria, seja frieza, seja o que for...
Enquanto houver tempo, haverá vida, e havendo vida, esperança haverá. Vale a pena olhar para diante, seguir em frente entoando um cântico diferente e vibrante, deixando para trás toda atitude inconseqüente e perseguir um futuro triunfante.
Há tempo, há vida, há esperança, há força. Vale a pena persistir, perseverar, pedir perdão e perdoar. Há mais por se conquistar na longa estrada a percorrer.
Enquanto houver tempo, há vida, há esperança, há muito mais a se fazer e muito mais por que lutar. Vale a pena despir-se dos andrajos espirituais, vestir-se de coragem, ousadia e confiança na Palavra do Senhor dos Exércitos, lembrando-se de que quem nele confia é mais que vencedor.
Enquanto houver tempo, enquanto houver vida, enquanto houver a presença de quem se ama e de quem precisa ser amado, vale a pena dizer: “Pai, eu te amo!” ou “Eu te amo, filho meu!”.
Se você não tem mais pai, junte-se a mim, porque também o meu já se foi, e só uma grande saudade no lugar dele se instalou. Se você não tem filho, seja porque já se foi, seja porque nunca veio, não fique triste: eu me empresto a você no dia dos pais.
Deus abençoe você...!

Crônica do exílio

Minha terra tem palmeira, coqueiro, mangueira, figueira, amendoeira, castanheira, pinheiro, tem árvore a dar com um pau, em que pousam e cantam sabiá, bem-te-vi, canário, coleiro, colibri, pardal e outros passarinhos, passarões, gaviões, que fazem ninhos e procriam na primavera, no verão, em tudo quanto é estação, enquanto não vem um ser que se diz humano e sai cortando, queimando, arrasando, em nome do progresso, do desenvolvimento e não sei mais o quê...
Minha terra tem gente com nome de árvore: Pereira, Oliveira, Moreira, Figueira e mais alguns que não lembro agora. Tem gente que é de Souza, de Moura, de Almeida, de Alcântara, da Cunha, Disso, Daquilo, da Silva, dos Anjos, de Jesus, dos Santos e outros tantos: Carneiro, Coelho, Pinto, Leão e outros bichos... e ainda outros mais estranhos e complicados: Barrichello, Ciccarelli, Mazzucchelli, González, Morales, Lafayette, Kubistchek, Vandekoken, Drummond, Bittencourt, Thibault, Yamazaki... Gente de tudo quanto é raça, cor e credo (credo!), de quanto é parte do mundo, gente bonita, gente feia, gente boa e, infelizmente, gente ruim também...
Minha terra tem muita terra sem gente e muita gente sem terra, sem teto, sem roupa, sem ter o que comer, sem saber como vai ser o dia seguinte. Sem esperança, sem sonhos... Sem vida, talvez... Tem gente sem rumo, sem remo, sem lenço, sem documento, sem ter onde cair morta, mas com isso não se importa, nem se importa com mais nada. Tem também muita gente sem caráter, sem vergonha, sem coração, sem educação, cem por cento sem juízo, sem escrúpulos, se aperfeiçoando na perversidade e se perdendo na própria insanidade...
Minha terra tem sabiás engaiolados, tem passarinhos morrendo sufocados nas matas queimadas, peixes morrendo asfixiados nos rios e nos mares poluídos pelo descaso e pelo descuido da população ribeirinha, urbana e insana das cidades grandes, pequenas e interioranas. Minha terra tem muita propaganda enganosa na televisão, no rádio, na imprensa escrita, na tal de Internet, mentiras e falsas promessas em tempos de eleição, eleitores enganados, traídos, desiludidos, desesperançados, à própria sorte esquecidos... crianças e idosos abandonados, pais desempregados, homens efeminados e, soltos, muitos bandidos safados e políticos desavergonhados vivendo às custas de trabalhadores ludibriados.
Minha terra tem frentes e bóias frias, panelas vazias, dias quentes e violentos, noites agitadas, vazias de sonhos, cheias de sobressaltos e horríveis pesadelos... Tem rebeliões nos presídios (que deveriam existir em maior número e conter mais ocupantes), casas de custódia e nas funabens e febens da vida... Tem chacinas, seqüestros, assaltos a mão armada, violência doméstica, guerras de bandidos contra bandidos, bandidos contra polícia, bala perdida e muita gente perdendo a vida nos cruzamentos, nos viadutos, nas pontes, na linha vermelha, na amarela, nas praças, nas esquinas, nos hospitais, nas escolas, nas faculdades, sabe-se mais aonde...
Minha terra tem adolescentes e jovens insolentes tornando-se delinqüentes nos becos, nos guetos, nos morros, nos calçadões, nas praias, na rua, na chuva, na fazenda ou numa casinha de sapê... Tem gente na minha terra que está vivendo só para si e gente que, por causa disso, está morrendo.
Mas, felizmente, tem também gente que está nadando contra a maré da desesperança, da idolatria, da feitiçaria, da cegueira espiritual e da perversidade que assola as cidades e a vida das pessoas... Tem gente lutando - com toda a força e com todo o coração - na guerra contra a fome, contra a ignorância, contra a violência, contra a escravidão, contra o poder maligno das trevas, contra tudo que afasta as pessoas umas das outras e de Deus. Tem gente que está, obstinadamente, buscando ver, com os olhos da fé, a face do Criador da vida na terra, na nossa terra, e com isso conseguindo olhar com amor para o seu semelhante... E é por isso também que essa gente assim vai vivendo sem medo da morte, sem medo da sorte, do perigo, do inimigo. Sem medo de ser feliz...!
Decottignies
maio, 2005.

domingo, 18 de setembro de 2011

O certo é xérox ou xeróx? Lá vem você de novo me perguntar isso... Não vai adiantar eu dizer que o certo é cópia ou fotocópia, você vai continuar falando xérox, ainda que a copiadora seja uma Nashua, Sharp, Lexmark ou de qualquer outra marca, e não Xerox. Então vá em frente, pode falar xérox, que nada de ruim vai te acontecer.

Aliás, você pode continuar falando rúbrica, em vez de rubrica; duzentas gramas, em vez de duzentos gramas de queijo; douze, em vez de doze, e pode continuar dizendo que a expressão “caraca” vem do sinônimo “sujeira” e não de uma palavra chula disfarçada. Mas experimente dizer sujeira, em vez de caraca. “Sujeira! Você está uma gata!” ou “Sujeira! O culto foi muito abençoado! Aquele pastor é bom pra sujeira!” Legal né?
Sabe de uma coisa? A língua é assim mesmo. De quando em vez, muda tudo, ou quase tudo. O que era certo vira errado, e vice-versa. Antigamente, o particípio passado do verbo pegar era pegado, mas aí teve um jacaré que inventou a forma pêgo, e outro inventou o pégo (grafei com acento, pra você saber). Pronto, agora até os dicionários já aceitam, e quem insiste em dizer “Se eu corresse, teria pegado o ônibus” é olhado assim meio de lado. E tem mais dois que estão mudando: trazer e chegar. Por exemplo, neguinho agora acha que deve dizer trago, em vez de trazido, e tem quem já fale assim: “A doutora ainda não tinha chego.” Daqui a pouco o certo vai ser dizer trago e chego, e não vai ser o bobão aqui quem vai mudar isso.
Na linguagem, entretanto, é café pequeno. Fora dessa esfera muitos conceitos estão mudando de lado. Não se deve mais, por exemplo, dar umas boas chineladas na bunda de um moleque aprontão ou dizer ao safadinho que ele que está de castigo; deve-se usar sempre o diálogo e colocar o pestinha para pensar, como se o pensamento fosse algo negativo. Mas disso, também eu já falei. Se voltar a falar, é porque eu sou assim mesmo, repetitivo. Não liga não...!