quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

João e eu

Agora eu vivo com Teresa. Mas hoje bateu saudade de João.
Tudo que aprendi, devo a ele. Era cuidadoso, carinhoso, me amava, me protegia. Todos os dias saíamos juntos, eu fazia de tudo para alegrá-lo e principalmente me divertia muito. Voltava pra casa cansado e faminto, ele preparava minha refeição e a dele. Eu comia com gosto. Depois, ainda brincava um pouco na sala, às vezes esbarrava num móvel e quase quebrava algo, ele me repreendia, mas não me castigava. Até dormíamos juntos. João... que saudade...!
Bons tempos em que eu passava o dia todo “cuidando” da casa... Ele voltava do trabalho exausto, e eu corria ao seu encontro. João me abraçava, me beijava, me fazia carinhos e aceitava os meus. Como eu amava João...
Só que um dia ele conheceu Pedro, e aí tudo começou a mudar. Pedro não gostava de mim, mas para não magoar João, me respeitava. Eu não respeitava, não confiava em Pedro; na verdade, tinha era medo dele, mas não havia nada que eu pudesse fazer. Pedro era muito estranho, mas João, cada dia mais, se ligava a ele. Era Pedro pra lá, Pedro pra cá, Pedro isso, Pedro aquilo... Claro que eu sentia ciúmes, mas eu não sabia demonstrar e acho até que mesmo se soubesse João não perceberia...
Aos poucos, nossa amizade – impressão minha, talvez – foi enfraquecendo. João já não brincava como antes, não tinha tanta paciência comigo, parava pouco em casa... Tenho certeza que aquilo era coisa de Pedro... Mas o que eu podia fazer?
Teve um dia que os dois chegaram esbaforidos, nervosos, eu tentei chamar a atenção de João, ele não deu a mínima. Pedro ameaçou me bater, quase me chutou. Não entendi nada... Entraram no quarto, recolheram roupas e alguns objetos, enfiaram tudo em duas malas e saíram. Não dormiram em casa. Passei a noite sozinho. Sozinho e triste. De manhã ainda esperei que eles voltassem, e nada... Sim, eu já estava acostumado a ver os dois chegando juntos das noitadas... Eles costumavam chegar de madrugada, mas nunca tinham passado uma noite fora. E eu esperei. E eles não chegaram... Esperei o dia todo... Nada...
Em vez de João e Pedro, chegaram uns homens mal-encarados, armados, quebraram tudo, reviraram a casa toda procurando não sei o quê...
Eu estava com fome. Muita fome... Como a porta estava aberta – sempre aberta – arrisquei sair sozinho em busca de comida. A princípio comecei a pedir às pessoas nas ruas que me dessem algo, mas elas não compreendiam ou não me davam atenção... Acabei procurando comida no lixo. Encontrei. Primeiro dia, segundo, terceiro... Não voltei mais para a casa de João. A vida nas ruas é difícil, mas eu acabei me acostumando. Apesar disso, continuava sentindo falta do meu amigo. De um amigo que fosse. De alguém que cuidasse de mim, me desse carinho.
Foi então que Teresa me encontrou. Eu estava com fome, ferido e doente. Ela me levou para casa, me deu comida e um lugar para dormir. Apresentou-me o marido, José, e os filhos, Antônio e Nina, duas crianças lindas por quem logo me apaixonei...
João era um grande cara, sinto muita saudade dele, mas não posso ser injusto. Ele me amava e me chamava de Amigo. Mas minha nova família também me ama, eu sinto isso. E eles me deram até um novo nome: Rex. E hoje me levaram para vacinar...